domingo, 31 de outubro de 2010

Os orientações linguisticas hoje e a escuta como arte da palavra

Augusto Ponzio

L’ascolto deriva dalla natura della parola, che vuole sempre essere ascoltata,  ricerca sempre una comprensione attiva e non si ferma alla prima, più prossima comprensione immediata, ma si spinge sempre più avanti (illimitatamente). [,,,]”La possibilità di ascolto” come tale rappresenta già una relazione dialogica. La parola vuole essere ascoltata, compresa, vuole ricevere una risposta e rispondere a sua volta alla risposta, e così ad infinitum. Essa entra nel dialogo.
 (M. Bachtin, Il problema del testo, 1960-61, trad. it. in A. Ponzio, a cura, Michail Bachtin. Semiotica, teoria della letteratura e marxismo Dedalo, Bari, 1977, pp. 227-229).

L’ascolto non è esterno alla parola, un’aggiunta, una concessione, una iniziativa di chi la riceve, una scelta, un atto di rispetto nei suoi confronti. L’ascolto è un elemento costitutivo della parola.
L’ascolto è dunque l’arte della parola, il suo fare, il suo mestiere, la sua attitudine, la sua prerogativa, il suo peculiare modo d’essere. Il peggior male che possa capitare alla parola è l’assenza di ascolto, l’assenza di interlocutore – non il tacere, che, al contrario, è proprio la condizione dell’ascolto, ma il silenzio
(A. Ponzio, Suan Petrilli, Lineamenti di semiotica e di filosofia del linguaggio, Bari, Grafis, 2008, Prfazione, p. v) .



1. Linguística do silêncio e linguística do calar

Ocupando-se unicamente dos elementos da língua e da frase, a linguística reconhece o silêncio como única condição do signo verbal. Ela não é capaz de lançar-se no espaço do calar, que é aquele da enunciação na sua irrepetibilidade, da palavra que é sempre outra palavra, palavra diferente, em relação de compreensão que responde com uma outra palavra.
A distinção entre “silêncio” e “calar” é tomada de um trecho das Notas de 1970-71 de Mikhail Bakhtin. Partimos dela para acrescentar algumas considerações.
Bakhtin distingue, de um lado, as condições da percepção do som e as condições da identificação do signo verbal, e de outro, as condições da compreensão do sentido da palavra, da enunciação. O silencio faz parte das duas primeiras, a recepção do som e a identificação do signo; enquanto o calar está entre as condições da compreensão do sentido.

Estetica ed etica nella concezione filosofica di Bachtin

Susan Petrilli

circa la parola letteraria e le scienze umane

Bachtin è un “filosofo”. Lo dichiara apertamente nelle sue conversazioni del 1973 con Viktor Duvakin: “Sono sempre stato e sono un filosofo”. Ma fin dal suo saggio su “Per una filosofia dell’azione responsabile” (del 1920–24), egli sceglie la letteratura, la scrittura letteraria, come l’angolatura prospettica della sua riflessione filosofica.
Ciò ha dato luogo ad equivoci interpretativi circa il “mestiere” di Bachtin: quel mestiere che non è una professione, non è un lavoro, non è un’occupazione: “il mestiere di filosofo”. Lo si è scambiato spesso per un critico letterario o per un teorico della letteratura. La riconosciuta ampiezza interdisciplinare della riflessione di Bachtin, anche quando lo si è relegato all’interno della teoria o della critica letteraria, è dovuta al fatto che la sua critica è filosoficamente orientata. Perciò, per quanto limitata ad una data questione, essa è talmente profonda e determinante da toccare numerosi territori circostanti della conoscenza umana e della coscienza stessa, con tutte le conseguenze che un tale approccio può comportare.
Ciò che permette il coinvolgimento interdisciplinare in questo caso non è affatto la pretesa di totalizzazione conseguente ad una sopravvalutazione di un settore disciplinare e quindi alla riduzione ad esso di qualsiasi altro sapere, ma proprio il suo opposto, vale a dire la critica alla chiusura totalizzante, un’analisi, una metodica, orientata nel senso della “detotalizzazione”, anche nei confronti della semplice pretesa di tale chiusura solo relativamente a un settore determinato della conoscenza.
 Il filosofo Mikhail M. Bachtin (1895-1875) a partire dal saggio menzionato degli inizi degli anni Venti, in base ad una scelta filosofica, si colloca all’interno della scrittura letteraria e non se ne allontana mai, perché è questo l’osservatorio da cui egli conduce la sua critica anti-sistemica e detotalizzante, rivelando i fili interni che collegano la letteratura all’extra-letterario e sottolineando quindi l’intertestualità strutturale sottostante al collegamento tra testi letterari ed extra-letterari. Per Bachtin il testo letterario sussiste e si sviluppa nella sua specificità di testo letterario grazie al coinvolgimento, anche in senso etico, con l’universo esterno.
Benché il suo principale campo di indagine sembri costituito dalla teoria della letteratura e dalla critica letteraria, egli procede in modo tale da infrangere i confini interni non soltanto delle discipline che concernono la letteratura, ma anche quelle dell’arte in generale.

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

A COMPLEXIDADE DO ATO TRADUTÓRIO, SUAS IMPLICAÇÕES ÉTICA E ESTÉTICAS, NAS (INTER)AÇÕES E (INTER)RELAÇÕES ENTRE SURDOS E OUVINTES


Adriane Menezes Sales

Tudo o que me diz respeito, a começar por meu nome, e que penetra em minha consciência, vem-me do mundo exterior, da boca dos outros (da mãe, etc.), e me é dado com a entonação, com o tom emotivo dos valores deles. Tomo consciência de mim, originalmente, através dos outros: deles recebo a palavra, a forma e o tom que servirão para a formação original da representação que terei de mim mesmo.[1]

A efervescência e os acalorados debates atuais sobre as questões e entraves ligados a da Educação Especial e Inclusão vivenciados, principalmente, nos últimos 20 anos, em muitos aspectos desviam as atenções e reflexões apenas para o cenário atual, como se esta problemática fosse fruto da sociedade moderna. No entanto, vários autores mostram que, na realidade, são séculos de história, marcados pelo alijamento, pela segregação e desresponsabilização diante das necessidades especiais dos indivíduos com deficiência, em todos os aspectos: sociais, psicoemocionais e educacionais (MAZZOTA, 2001; MENDES, 2006; SASSAKI, 1997).
A partir da década de 1970, é possível observar um momento de mudança, demandado pela intensificação e fortalecimento de uma série de movimentos sociais mundiais em prol dos direitos humanos e de acesso à educação para pessoas com deficiências, que incide em um processo de mudança nos paradigmas educacionais, em busca de uma transformação, “garantidora” de respostas eficazes aos desafios postos pelas necessidades especiais que cada “aluno deficiente” apresenta as escolas e as sociedades (BUENO, 1993).
Para Veríssimo (2001), o paradigma da inclusão coloca-se como um processo de adaptação social para incluir as pessoas com necessidades especiais em seus sistemas gerais, e, ainda, dar-lhes o preparo e a oportunidade de assumirem seus papéis na sociedade. Porém os avanços e conquistas legalmente consolidadas, não tornam menos complexas à realidade e as necessidades demandadas no processo de inclusão dos deficientes, seja no âmbito educacional e/ou social, nem tão pouco, suas imposições, por si só, irão transformar em práticas reais seus dispositivos legais. É necessário transpor as dificuldades de implementação efetiva, do que já está posto, dentro e fora das escolas.
Neste sentido e, em decorrência das grandes mudanças ocorridas na área educacional em geral, dentre as quais, a inserção de uma nova modalidade de ensino especificamente direcionada a educação especial na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDBEN (1996), e todos os entraves de sua implantação nos Sistemas de Ensino, o cenário atual abriga a coexistência de dois enfoques identificáveis nas práticas educacionais: um deles baseado nos déficits e o outro num perfil cultural-integrador que, implica na atual perspectiva de inclusão, conforme aborda Costas e Pacheco (2006, s/n).
[...] embora ainda não esteja totalmente superada a proposição que entende que a falha está no aluno devido a suas deficiências, questiona-se, cada vez mais, o papel da instituição de ensino, e até que ponto ela falha ao não ser capaz de dar resposta às demandas de seus alunos.
Neste contexto, nossa discussão é voltada a maneira como o processo de “inclusão” educacional de crianças surdas vem acontecendo e, principalmente, ao papel do intérprete de língua de sinais/português diante do processo pedagógico desenvolvido nas escolas. Lacerda (2000) aborda que a problemática da escolarização do surdo tem um histórico de muitos comprometimentos, desde a educação básica. Segundo a autora, parte significativa deste problema dá-se em função das limitações dos surdos na área da linguagem, que acarretam intensas dificuldades de leitura e escrita.
Esta problemática pode ser observada nos resultados acadêmicos, tanto dos que viveram processos de escolarização especial, quanto dos que estudaram nas redes regulares de ensino. Após vários movimentos importantes que marcam a evolução dos processos de comunicação entre os surdos e deles com a sociedade, academicamente, hoje, a proposta de educação bilíngüe configura-se como um processo alternativo e mais apropriado a um atendimento educacional de qualidade (LACERDA, 1998).
De acordo com estudos desenvolvidos por Bouvet (apud LACERDA, 1998, p.72) a linguagem de sinais torna possível "[...] uma comunicação eficiente e completa como aquela desenvolvida por sujeitos ouvintes. Isso também permitiria ao surdo um desenvolvimento cognitivo, social etc. muito mais adequado, compatível com sua faixa etária". No entanto, a autora pontua que, a inserção de alunos surdos no sistema regular de ensino não se fará sem o "reconhecimento de que os alunos necessitam de apoio específico, de forma permanente ou temporária, para alcançar os objetivos finais da educação e, então, devem ser oferecidos, por exemplo, apoios tecnológicos e humanos. Um desses apoios humanos é o intérprete de língua de sinais" (LACERDA, 2000).
A presença, na sala de aula, do Intérprete de Língua de Sinail (ILS) pode viabilizar um processo de ensino e aprendizagem mais eficaz, visto que o surdo pode contar com a interlocução feita pelo intérprete. Neste processo o aluno,
[...] recebe a informação escolar na língua de sinais, que é sua língua de domínio, de uma pessoa com competência nessa língua. Ao mesmo tempo, o professor ouvinte ministra suas aulas sem se preocupar em como passar esta ou aquela informação em sinais, atuando em uma língua que domina (LACERDA, 2000, p. 74-5).
Esta alternativa apresenta implicações diretas na prática pedagógica a ser desenvolvida nas salas de aula, dentre elas a preparação do ambiente escolar para abrigar outra forma de linguagem, "dando a essa língua um status social de pertinência" e, ainda, o "acesso aos conhecimentos da cultura à qual pertence por intermédio de uma língua que ele domina" (LACERDA, 2000, p. 75). A autora aponta ainda que o papel do intérprete não se reduz a interlocução, nem mesmo a “simples” tradução.
[...] o tradutor-intérprete atua na fronteira entre os sentidos da língua de origem e da língua alvo, com os processos de interpretação relacionando-se com o contexto no qual o signo é formado. O sentido do enunciado é construído na interação verbal, e é atualizado no contato com outros sentidos, na relação estabelecida entre interlocutores. A interpretação é um processo ativo, que procede de sentidos que se encontram, existindo, apenas, na relação entre sentidos, como um elo numa cadeia de sentidos. Pode-se dizer assim que a interpretação se revela na multiplicidade de sentidos existentes (LACERDA, 2000, p. 6).
Dada esta complexidade, buscamos, apoiados nas concepções bakhtinianas, refletir sobre as implicações ética e estéticas do ato tradutório e suas repercussões nas (inter)ações e (inter)relações entre surdos e ouvintes, as quais pretendemos partilhar e no exercício de diálogos, ampliar, com autores do circulo e participantes das Rodas de Conversa 2010.
E tendo em vista, nosso interesse em compreender a forma como essas crianças se incluem e/ou são incluídas, academicamente e socialmente, dentro das salas de aula, nas relações e interlocuções, do cotidiano escolar, faz-se necessário discutir algo que encontra-se nebuloso, em processo de construção/(in)definição, o papel do intérprete de língua de sinais no espaço escolar ou intérprete educacional. Contudo, do que estamos falando quando nos referimos à interpretação/tradução??
O papel do intérprete e as implicações, ética e estética, do ato tradutório...
O ato da tradução envolve uma escala multidimensional de significantes e significados que desvelam as dimensões, a profundidade e a alta complexidade da sua atuação.
Segundo Sobral (2008, p. 7-8),
Todo ato de tradução envolve uma atividade de leitura de um texto numa dada língua que difere da leitura em geral porque é feita do ponto de vista de um profissional que,em vez de apenas entender o que lê ou responder / reagir ao que lê,deve enunciá-lo para outros interlocutores, tem de reconstituir / reconstruir / restituir o que lê em outra língua,e que, portanto, tem de penetrar em dois universos de discurso e colocá-los numa relação de interlocução,constituindo-se num mediador entre o autor do texto,que se dirige a um dado público que conhece,e o público do texto traduzido,ao qual o autor não pode dirigir-se diretamente.
Nesta perspectiva, nossa preocupação está centrada nas práticas de interpretação entre Libras e a língua portuguesa, tendo em vista que os intérpretes de língua de sinais (ILS) são partícipes fundamentais na participação, envolvimento destes alunos com a comunidade escolar e para o acesso destes aos conhecimentos e informações acadêmicas e sociais, que constituem os processos de construção de conhecimentos.
Dentro de uma perspectiva estética, fundamentada na concepção bakhtiniana, o papel do tradutor é, primeiramente de aproximação, de conhecimento do e sobre o outro com quem irá (inter)agir, no caso dos intérpretes educacionais, professores e alunos surdos e ouvintes...
O primeiro momento da minha atividade estética consiste em identificar-me com o outro: devo experimentar – ver e conhecer – o que ele está experimentando, devo colocar-me em seu lugar, coincidir com ele (...) Devo assumir o horizonte concreto desse outro, tal como ele o vive. (BAKHTIN, 1992, p. 45).
Destacamos a questão, não apenas para definir nosso ponto de partida sobre a atividade estética, mas para, neste ensejo, dar ênfase a questões como...
Cabe ao intérprete conhecer a situação do conjunto de surdos no âmbito da cultura brasileira. Isso apresenta dois aspectos: de um lado, trata-se de uma língua não oral, de uma maneira não oral de perceber, de pensar e de se exprimir, no interior de uma cultura oral e em contato com uma língua oral dominante; de outra, o surdo tem uma dada imagem do interior dessa cultura que nem sempre o respeita [...] A situação do surdo não é a mesma do ouvinte; não se trata apenas de ter outra língua, mas ter uma língua não oral num ambiente sociocultural oral e de coexistir como surdos num território de ouvintes (SOBRAL, 2008, p. 132)
Além destas singularidades, pensar sobre a tradução/interpretação, mediando situações didático-pedagógicas em ambientes educacionais, nos quais circulam informações e conhecimentos das mais diversas naturezas e especificidades, exige do ILS diferentes saberes e condições de atuação, tais como; domínio profundo dos conteúdos escolares em uso, conhecimentos sociais, políticos e culturais, além das idiossincrasias do grupo de alunos e professores com os quais atuará. E, a posição a ser ocupada por eles (ILS’s) não pode se distanciar desta situação concreta - realidade social e histórica.
Apoiados, novamente, em Sobral e seus apontamentos sobre Bakhtin, acreditamos na necessidade de dar acabamento[2] a nossa discussão, adentrarmos, também, no que tange a  tradução como ato ético.
]Segundo Sobral (2008, p. 224), a filosofia bakhtiniana do ato ético refere-se a
[...] responsividade ética aos outros sujeitos. Para Bakhtin, “não há álibi na existência”, e os atos do sujeito, sejam ou não voluntários, são responsabilidade sua, ou melhor, “responsibilidade” sua, isto é, responsabilidade pelo ato e responsividade aos outros sujeitos no âmbito das práticas em que são praticados os atos (SOBRAL, 2008, p.224).
Nestes aspectos, refletir sobre (inter)ações e (inter)relações entre o ILS, professores, alunos surdos e ouvintes, incide em pensar sobre as necessidades e escolhas que permeiam estas ações/relações. Trata-se de pensar sobre as condições e reações diante dos textos e contextos do trabalho pedagógico em curso, que dentre os aspectos técnicos da tradução, as demandas operacionais e relacionais, encontram-se centradas no processo de produção de enunciados/enunciações e construção de significados, fundamentais aos propósitos de desenvolvimento e escolarização em jogo.
Como um, dos inúmeros exemplos possíveis, vê-se que, diante do enunciado do professor, que escolhe “o que, como e a quem dizem” (cada turma ou grupo para os qual direciona seu enunciado), cabe ao ILS, em atividade estética (criadora) e ética (responsável/responsiva), garantir a realização do ‘projeto-de-dizer’ do professor para os alunos e vice-versa.
Esta e as demais situações a que se refere este ato tradutório é, em essência, muito mais do que “transcrição” ou mera escolha de palavras equivalentes, refere-se a um processo de construção de sentido, de negociação de significados. Vale ressaltar que, as palavras se materializam na atividade de interação verbal, como signos ideológicos, transformando-se e assumem os mais variados significados de acordo com o contexto no qual está inserida, o que implica na situação social e no lugar ocupado pelos falantes.

A palavra dirige-se a um interlocutor: ela é função da pessoa desse interlocutor: variará se se tratar de uma pessoa do mesmo grupo social ou não, se esta for inferior ou superior na hierarquia social, se estiver ligada ao locutor por laços sociais mais ou menos estreitos (pai, mãe, marido, etc.). Não pode haver interlocutor abstrato; não teríamos linguagem comum com tal interlocutor, nem no sentido próprio nem no figurado (BAKHTIN, 2006, p.116)
E sem encerrar as questões deste breve ‘pensar’ sobre estas inquietações relacionadas a complexidade do ato tradutório, suas implicações ética e estéticas, nas (inter)ações e (inter)relações entre surdos e ouvintes, finalizamos essas colocações iniciais – que certamente terão seus significados atualizados após as Rodas de Conversa, com um último apontamento: a demanda por um Intérprete de Língua de Sinais/Português, qualificado profissionalmente para atuar em espaços educacionais e formativos - explícita ou, em alguns casos, implícita, a toda legislação que pontua questões relativas a acesso, permanência e sucesso acadêmico de pessoas surdas - configura-se como uma necessidade contemporânea.
Neste sentido, tanto o papel deste profissional nos processos de formação, quanto a sua própria formação e a construção identitária profissional desta nova categoria de trabalho precisam ser pensadas, pesquisadas e discutidas para um avanço positivo, tanto da educação de alunos surdos, quanto da profissionalização do ILS. Além do que, acreditamos na importância de direcionar uma atenção especial a forma como os ILS ‘são vistos, compreendidos e falados’ no espaço escolar?!, e, ainda qual o significado desta forma de ver – se ver e ser visto – nas comunidades surdas e nas instituições para a formação de (auto)conceitos/posturas, sobre o fazer do intérpretes e sobre si mesmos??
São pontos e contrapontos, indagações, vistas como primeiros passos para avançar no pensar do ato tradutório, suas singularidades, suas generalidades...
... [como] uma mediação que depende da apropriação específica que cada sujeito, singular que é, faz pessoalmente da “interpretação” (objetivação) coletiva do mundo dado.
Adail Sobral[3]



Referências
BAKHTIN, Mikhail M. Estética da Criação Verbal. São Paulo: Martins Fontes, 1992.
BAKHTIN, M. Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico da linguagem. 12. ed. São Paulo: Hucitec, 2006. 203 p.
BUENO, J. G. Educação especial brasileira: integração/segregação do aluno diferente. São Paulo: Educ, 1993.
COSTAS, F. T.;PACHECO, R. O processo de inclusão de acadêmicos com necessidades educacionais especiais na Universidade Federal de Santa Maria. In: VI Congresso Internacional para Educação Popular e XV Seminário Internacional de Educação Popular, 2005, Santa Maria, RS. Anais. Santa Maria, RS : Pallotti, 2005. p.89.
LACERDA, C.B.F. Um pouco da história das diferentes abordagens na educação dos surdos. Cad. CEDES [online]. 1998, v. 19, n. 46, p. 68-80. ISSN 0101-3262.
________. A prática pedagógica mediada (também) pela língua de sinais: trabalhando com sujeitos surdos. Cad. CEDES [online]. 2000, v. 20, n. 50, pp. 70-83. ISSN 0101-3262.
LOPES, Ana Elisabete. Ato fotográfico e processos de inclusão: análise dos resultados de uma pesquisa-intervenção. In: LENZI, Lucia Helena Correa; DA ROS, Silvia Zanatta; Souza, Ana Maria Alves de; GONÇALVES, Marise Matos. Imagem: intervenção e pesquisa. (orgs.). Florianópolis: Editora da UFSC: NUP, CED, UFSC, 2006.
MAZZOTTA, M. Educação especial no Brasil: história e políticas públicas. São Paulo: Cortez, 2001.
MENDES, E. G.. A radicalização do debate sobre inclusão escolar no Brasil. Revista Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, v. 11, n. 33, Dec. 2006. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-24782006000300002&lng=en&nrm=ISO->. Acessado: 02 de maio de 2010
SASSAKI, R. K. Inclusão: construindo uma sociedade para todos. Rio de janeiro: WVA, 1997.
SOBRAL, A. O Ato “Responsável”, ou Ato Ético, em Bakhtin, e a Centralidade do Agente. Signum: Estudos Linguisticos, Londrina, n. 11/1, p. 219-235, jul. 2008.
VERÍSSIMO, H. Inclusão: a educação da pessoa com necessidades educativas especiais - velhos e novos paradigmas. In: Benjamin Constant, n. 18, p.6-10. Rio de Janeiro, 2001.


[1] (BAKHTIN, 1992, p.126)
[2] Noção de acabamento, também centrada em Bakhtin, na qual “só um outro pode nos dar acabamento e somente nós poderemos dar acabamento a um outro. Cada um de nós se situa num determinado horizonte e necessita do outro para completar o que falta ao nosso horizonte de visão.” (LOPES, 2005)
[3] Sobral (2008, p. 232)

domingo, 17 de outubro de 2010

Ética e Estética em Eles eram muitos cavalos



Rafael Borges Ribeiro dos Santos[1]
        Neste pequeno escrito tentarei abordar alguns aspectos no que diz respeito a estética presente na obra de Luiz Ruffato - Eles eram muitos cavalos, buscando apontar como tal estética (na perspectiva de Bakhtin) busca sua essência na ética e a partir daí consegue criar sua própria identidade, se caracterizando como uma desconstrução do romance.
        Uma característica muito importante da obra, que colabora para essa desconstrução do romance e ao mesmo tempo para a criação de sua identidade é a fragmentação. Está já é anunciada pelo próprio título do livro, que nos sugere a idéia de vários cavalos que passam pela cidade de São Paulo pisoteando-a de maneira cruel e desumana. Tais cavalos, podemos pensar que sejam metaforicamente a representação dos próprios habitantes da cidade, desde a classe social mais alta até a mais baixa, que ao longo da narrativa vão sendo animalizados de forma tão impressionante ao ponto de perderem completamente suas identidades e desse modo criarem a identidade da obra.
        Talvez seja esse o motivo de tal obra ter como personagem central a cidade de São Paulo, é como se todos os outros personagens chegassem a um nível primitivo de animalização tão grande, que perdendo a consciência da vida e a capacidade de sentir qualquer sentimento bom, os tornassem ao mesmo tempo indignos de obter um papel de destaque no livro. Toda essa construção textual fragmentada da obra se acentua ainda mais ao incorporar em sua estética diversos gêneros do discurso que vai desde oração, lista de livros, certificados, horóscopo até uma página em preto, que nos sugere várias interpretações.
        A sensação que esse recurso gera a um leitor mais atento, é que Ruffato lançando um olhar muito crítico e até um pouco impiedoso sobre as relações éticas presentes na cidade de São Paulo, tenha resgatado dessa realidade os pontos cruciais para o desenvolvimento da estética de sua obra. E a partir daí tenha colocado cada personagem no seu devido lugar, sem a hipocrisia social que mascara os verdadeiros papéis que assumem na vida.
        Apoiados nessa visão, podemos pensar que Ruffado constrói a estética do seu livro fazendo um recorte das relações éticas que observa nas grandes metrópoles, porém com um pequeno detalhe. Ao encarnar esses fatos em sua obra, eles ganham um tom realista maior do que os da própria vida, pois estão despidos de um social que ao invés de nos civilizar acabou, ao longo do tempo, por nos tornar mais animais do que fomos nos tempos primitivos de nossa espécie.

Bibliografia
RUFFATO, Luiz, 1961-. Eles eram muitos cavalos. 6 ed. Rio de Janeiro: Record, 2007. 158 p.
BAKHTIN, Mikhail Mikhailovitch, 1895-1975. Estética da criação verbal. [Estetika slovesnogo tvortchestva]. Maria Ermantina Galvão G. Pereira (Trad.). 2 ed. São Paulo: Martins Fontes, 1997. 421 p


[1] Graduando em Letras. Universidade Federal de São Carlos. E-mail: rafaeljud@hotmail.com

Concepções linguísticas no ensino de língua portuguesa, a partir do pensamento de João Wanderley Geraldi



                                                           Luzia de Fátima Paula
No final da década de 1970 e início da década de 1980, quando, no ensino de língua portuguesa no Brasil, apresentavam-se problemas com relação à repetência e evasão, no âmbito linguístico, diversas concepções eram contrapostas à advinda da Linguística Descritiva, em voga até aquele momento. No Brasil, as concepções advindas da Linguística Descritiva, da Gramática Gerativa, da Sociolinguística, da Teoria da Enunciação e da Análise do Discurso participavam de uma “formação discursiva” no âmbito da linguística.
No momento de sua formação, quando novas concepções linguísticas estavam sendo discutidas no interior do IEL/UNICAMP, João Wanderley Geraldi participava dessas reflexões, e a constituição de seu pensamento aconteceu em meio aos embates entre essas concepções, inicialmente em instituições de seu estado de origem, e, posteriormente, no IEL/UNICAMP.
Seus primeiros textos publicados abordam as questões descritivas da linguagem, tendo por fundamentação teórica a Linguística Descritiva.  No entanto, para abordar o ensino de língua portuguesa, Geraldi se apoia, teoricamente, sobretudo, em concepções advindas da Gramática Gerativa, da Sociolinguística, da Teoria da Enunciação e da Análise do Discurso. Em seu pensamento, são perceptíveis esses embates teóricos, como “choques”, já que o conhecimento não acontece de forma retilínea, mas a partir de descontinuidades.
Dessa forma, a partir do que se estuda, do que se conhece, novas concepções vão se constituindo. Essas descontinuidades são perceptíveis e se definem aos olhos do leitor, especialmente a partir dos textos citados por Geraldi, que se apresentam, ora de forma mais recorrente, ora deixando de ser citados. Essa descontinuidade pode ser constatada a partir da análise da trajetória de publicação de seus textos.
Assim como afirma Geraldi (2004a), os estudantes da pós-graduação estavam lendo, naquela época, na área da linguística, o que “estava no ar”. No entanto, nesse sentido, o seu diferencial foi pensar do interior da linguística o ensino de língua portuguesa, tendo escolhido o professor por seu interlocutor. Do interior da universidade, ele pensou em cursos para o professor, por considerar a necessidade dessa ação em conjunto com o professor no espaço da sala de aula, o que lhe permitiu pensar a linguística vinculada ao ensino de língua portuguesa.
A partir dos embates teóricos na área da Linguística, entre estruturalistas, gerativistas, sociolinguistas, linguistas pautados na enunciação, filósofos da linguagem e analistas do discurso, os “choques” foram ocorrendo, solidificando os conceitos-chave de sua proposta. Perdura em seus textos a discussão sobre “linguagem”, “sujeito” e “discurso/texto”.
Aproveitando o pensamento de Kuhn (1982) sobre a ideia de “crise”, é possível compreender que o pensamento geraldiano se constituiu na Linguística, contribuindo para o ensino de língua portuguesa, no momento em que uma “crise” se instaurava nesse ensino e no qual eram necessários outros paradigmas para que houvesse um novo sentido: “O significado das crises consiste exatamente no fato de que indicam que é chegada a ocasião para renovar os instrumentos” (p. 105).
Nesse sentido, segundo Kuhn (1982), quando necessárias para a sociedade, há “revoluções científicas”. Usando seu termo, é possível afirmar que o pensamento de Geraldi sobre o ensino de língua portuguesa, ainda atual nos dias de hoje, participou/participa de uma “revolução científica”, na medida em que propôs/propõe um “deslocamento” das ideias linguísticas para o ensino de língua portuguesa. Dessa forma, em um momento em que ocorria a busca por transformações político-sociais em nosso país, “olhares diferenciados” eram lançados também à linguagem, a fim de se buscar nela respostas a diferentes áreas. Com relação à abordagem da linguagem como resposta a várias questões, Kristeva (1969) menciona o olhar diretamente voltado ao sujeito, ocasionado por essa perspectiva.
Sobre o lugar de Geraldi como autor, segundo Bakhtin (2003), o autor se complementa no excedente de visão possível somente ao leitor, que é quem consegue visualizar o todo. Para ele, apesar de o autor ser conhecedor do todo, que é capaz de dar acabamento a uma obra, ele não deve viver do seu “[...] acabamento e do acabamento do acontecimento, nem agir”, pois, ele precisa “[...] ser inacabado, aberto [...] ao menos em todos os momentos essenciais  [...].” (BAKHTIN, 2003, p. 11)
A partir das ideias de Bakhtin, é possível compreender que o texto se complementa na interação do autor com o leitor, no excedente de visão próprio do leitor. Também nas palavras de Bakhtin (2002), “[...] a palavra é a arena onde se confrontam aos valores sociais contraditórios; os conflitos da língua refletem os conflitos de classe no interior mesmo do sistema: [...].” (p. 14, grifos do autor). Nesse lugar de embates se constituiu a tríade “linguagem, sujeito e discurso/texto”, no movimento característico do conhecimento, com cada elemento se complementando a partir das proposições de Geraldi, para pensar o ensino. 
Assim, considero que, em meio a deslocamentos e rearranjos, tendo o texto como objeto de ensino, na mediação entre sujeito e linguagem, conjuntamente com o pensamento de outros autores, o pensamento geraldiano se digladiou e também se somou a outros pensamentos em sua constituição, refletindo sobre questões ligadas à educação, e, mais especificamente, sobre o ensino.  E, com relação ao que representou a proposta de Geraldi para o ensino de língua portuguesa, caracterizo-a como uma transformação no ensino da língua, em um momento de embates na área linguística que proporcionou pioneiramente o “deslocamento” das concepções linguísticas para o ensino de nossa língua.


Referências bibliográficas:

BAKHTIN, Mikhail. Marxismo e filosofia da linguagem. Tradução de Michel Lahud e Yara F. Vieira. 10. ed. São Paulo: HUCITEC, 2002.

______. Estética da criação verbal. Tradução de Paulo Bezerra. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

GERALDI, João Wanderley. Entrevista [24/06/2004]. Entrevistadora: Luzia de Fátima Paula. Campinas: Universidade Estadual de Campinas, 2004. 1 fita cassete (30 min). Não-publicada.

KHUN, Thomas S. A estrutura das revoluções científicas. Tradução de Beatriz Vianna Boeira e Nelson Boeira. São Paulo: Editora Perspectiva, 1982.

KRISTEVA, Julia. História da linguagem. Tradução de Maria Margarida Barahona. Lisboa: Edições 70, 1969.