Wilson George de Brito Corrêa – UFPA
A proposta de dialogismo em Bakhtin, para o qual cada pessoa possuiu um conjunto de experiências de vida diferentes e interações sociais bastante particulares. Essa formação do individuo proporciona uma capacidade de ver o mundo de forma diferente, porém, esta maneira de interpretação individual é ajustada aos modelos reguladores das relações sociais existentes. E por estes meios que ocorrem as manifestações de confronto entre pessoas e grupos sociais. Nesse aspecto, podemos analisar as diferentes relações sociais, tendo em vista os novos paradigmas de estudar a comunicação por meio de entender que não há apenas um agente comunicativo, como era observado em esquemas que privilegiavam o apenas o emissor e que o ouvinte era desconsiderado no processo comunicativo. Deste modo, não aceitava a interação comunicativa entre as pessoas e colocava o ouvinte apenas como depositário de informações.
Pode-se colocar que a palavra existe para o locutor sob três aspectos: como palavra neutra da língua e que não pertence a ninguém como palavra do outro pertencente aos outros e que preenche o eco dos enunciados alheios/ ela já se impregnou de minha expressividade, mas esta expressividade de uma situação real, que se atualiza através do enunciado individual. Neste caso, a palavra expressa um juízo de valor de um homem individual e apresenta-se como um aglomerado de enunciados [...]. Nossa fala, isto é, nossos enunciados (que incluem as obras literárias), estão repletos de palavras dos outros [...]. As palavras dos ouros introduzem sua própria expressividade, seu tom valorativo, que assimilamos, reestruturamos, modificamos. (BAKHTIN, 1997, p. 313-314)
Esses três aspectos apontados por Bakhtin (1997) possibilitam analisar que no locutor esta integrada a expressividade e o juízo de valor de uma determinada pessoa ou sociedade. Isso permitiu analisar a própria ação comunicativa como ideológica. Para Brait & Melo (2005, p. 63), “uma mesma frase realiza-se em um número infinito de enunciados, uma vez que esses são únicos, dentro de situações e contextos específicos”. Nesta conjuntura procurarei analisar alguns enunciados existentes dentro da imprensa paraense no momento do Golpe Militar em 1964, tendo como base teoria do pensamento bakhitiniano de dialogismo, estética e ética. E importante ressaltar que neste período pesquisado pode ser encontrado uma grande quantidade de crimes em nome da Segurança Nacional, no qual o regime de governo instalado durante o Golpe Militar no Brasil que durou de 1964 a 1985, trouxe consigo bastante repressão aos grupos oposto ao seu governo e fazendo várias modificações nas leis brasileiras para dar respaldo jurídico as suas atitudes muitas vezes arbitrárias.
Este trabalho buscará analisar o papel da imprensa dentro do Pará. Isso será alcançado por meio de pesquisa da situação que o Pará se encontrava, tendo como perspectiva uma analise histórica sobre situação que Estado estava passando como a vinculação do estudo de Bakhtin referente ao dialogismo, estética e ética. Este estudo terá como alicerce de pesquisa um jornal da época Folha Vespertina e as bibliografias sobre o assunto abordado.
Em várias regiões do Brasil ocorria apoio assim como também oposição ao novo governo e no Estado do Pará não foi diferente. Nos jornais pesquisados na Fundação Cultural Tancredo Neves pode ser encontrado já nos primeiros dias da instauração do Regime Militar um conjunto de noticias que faziam apologia ao governo que assumiu a direção do País em 1964, e o expurgo do antigo governo de João Goulart. Entre estes jornais pesquisados está a Folha Vespertina, no qual farei uma análise por meio dos discursos éticos e estéticos contidos dentro de imagens apresentadas por este jornal e procurar as propostas de governo que apresentam para o leitor, tendo a perspectiva de que os jornais não trazem uma verdade, mas interpretação de determinados fatos contendo a influência do meio em que estes jornalistas estão envolvidos.
Segundo De Lucas (2005), que discute sobre a historicidade da utilização dos jornais e a importância deste veículo de comunicação vem adquirido com o tempo para o historiador, tendo em vista que este recurso documental era bastante criticado por alguns pesquisadores, pois as noticias contidas demonstravam ser pouco adequadas para a análise do passado, devido ao jornal apresentar apenas um registro fragmentado do presente não trazendo desta maneira informações por completo, mas sob a influência de interesses vinculados aos jornais cujo propósito estaria na divulgação e proliferação de ideologias e conceitos previamente formulados por compromissos ou paixões, também fornece opiniões parciais e distorcidas dos acontecimentos.
Entretanto pode ser encontrado dentro destes jornais um conjunto de informações sobre o cotidiano da sociedade, e os modos de como estes indivíduos interpretavam a sua realidade, e perceber os vínculos socais em que estes jornais estavam inseridos possibilitando uma melhor análise de como foi apresentado para a população informações referente à situação sócio-político que o Brasil passava.
No entanto, a imprensa no Pará sofreu uma censura logo no início da Ditadura Militar, tendo como seu principal foco de censura o Jornal o Dia, pois este era considerado de tendências esquerdista. O restante da imprensa oficial do Pará acomodou-se perante o Governo Militar, entre estas estava configurado o papel que a Folha Vespertina teve durante a Ditadura Militar.
É importante ressaltar que este jornal era agente político, e o seu diretor Paulo Maranhão participava ativamente do Governo Militar, sendo ele também diretor e dono do jornal Folha Norte. Ele participava do partido político MDB, no qual foi um dos partidos que apoio a instauração do Regime Militar e em seu jornal como já foi comentado a história política deste logo acima, tende a utilizar o jornal de maneira de divulgar as tendências de ideologia presentes no seu proprietário.
Esta perseguição contra o Jornal O Dia, implicou na decretação de sua falência no ano seguinte ao Golpe Militar. Outros jornais de pequeno porte também promoveram algum tipo de oposição ao Governo Militar, como é o caso do jornal Papagaio que era distribuído pelos universitários do curso de economia da UFPA, este jornal tinha como seu slogan “apanha, mas não fica de bico calado”. Mas e importante enfatizar que a maioria dos grandes jornais realizava uma autocensura, onde não procuravam entrar em confronto com as autoridades militares, tendo em vista que estes raramente apresentavam alguma matéria contrária a Ditadura Militar, estando na maioria das vezes num jogo, no qual posteriormente vai se configuram o conjunto de normas encontradas no Ato institucional n° 5, onde estes jornais já passavam a partir do ano de 1964 a perspectiva de uma “liberdade vigiada”.
A linguagem passada pelo jornal percorrer em diversos lugares dentro do estado paraense, no qual formaram opiniões e formalização interpretações com juízo de valor por meio da linguagem praticada, para Stam (1992, p. 30-31),
A consciência é lingüística e social. Existe unicamente sob uma forma material, e nesse sentido, é um fato objetivo e uma força social [...]. Em toda parte entra nos arranjos hierárquicos de poder [...]. As pessoas não aceitam uma língua, mas é através da linguagem que elas se tornam consciente e começam a agir sobre o mundo, com e contra os outros.
Esta consciência impregnada dos “arranjos hierárquicos de poder” pode ser encontrada presentes em diversos modos de linguagens, entre estes a linguagem jornalística que algumas vezes esta ligada a modelos político-econômicos, que apesar de terem uma função de apenas informar, acaba formando conceito com um excessivo juízo de valor.
As reportagens são colocadas para o público com uma formatação estética, possuindo um conjunto de elementos feitos para prender a atenção do leitor, um destes e a utilização de imagens que também permite identificar a carga de intencionalidade da reportagem. Esta pode ser observada dentro deste conflito existente no Brasil no ano de 1964, em que no Pará teve manifestação de aposição ao Golpe Militar, um grupo destes contrários era o Comando Geral Dos Trabalhadores (CGT), no qual o seu presidente Raimundo Jinkings começou a ser perseguido, pois era acusado de agir como agente comunista e de estar envolvido com Leonel Brizola, governador do Rio Grande do Sul, um dos maiores opositores da retirada de João Goulart do poder. Na reportagem da Folha Vespertina (1964) foi veiculada pelo meio de comunicação a perseguição policial a Jinkings e João Barreiro, que estavam no município de Bragança, onde foi colocado como um agressor a liberdade democrática brasileira por contrariarem o regime que governava o seu país, uma atitude que deveria ser possível para um país dito democrático.
Contém abaixo desta foto as seguintes informações:
Publicamos acima a fotografia de dois dos elementos que estão sendo procurados pelas autoridades policiais (ordem política) e militares (exército), cujas atividades subversivas em nossa capital são bastante conhecidas. Os elementos são Raimundo Antonio da Costa Jinkings, presidente do CGT em Belém, e o engenheiro João Luiz Barreiros Araújo, e que se encontra desaparecidos, desde o dia 10 de abril do ano em curso. Quem souber do paradeiro de tais elementos deve avisar as autoridades policiais mais próximas, pois a captura de ambos e de suma importância (A PROVÍNCIA DO PARÁ, 1964).
Pode ser notado tanto na foto quanto no texto há uma proposta de colocar Jinkings e João Araújo como criminosos que causavam perigo a sociedade. Isto é identificado na foto que contém a informação de “Cuidado com eles, aponte-os a polícia”, com a proposta de embutir a noção de medo e perigo para quem encontrar essas pessoas. Uma das razões que o próprio jornal informa estaria embasada na história política e ideológica, “cujas atividades subversivas em nossa capital eram bastante conhecidas”, essas atividades apresentadas nos jornal estão vinculadas ao papel político adquirido por Jinkings como presidente do CGT (Comando Geral dos Trabalhadores), o qual buscou dentro dos sindicatos de Belém, promover greves e manifestações para pressionar o governo a melhorar as condições de vida dos trabalhadores do Pará. E dentro da perspectiva de prender os que eram considerados os maiores agitadores, que influenciavam os sindicatos se realizaram uma “caça” intensificada, “pois a captura de ambos e de suma importância”. Na imagem é possível também observar que apesar de apontar as duas pessoas como extremamente perigosas, elas não aparentam ser tudo de negativo que a reportagem indica. Segundo Bakhtin (1993, p. 50),
A estética deve determinar a composição imanente do conteúdo da contemplação artística na sua pureza estética, isto é, o objeto estático, a fim de descobrir que significado tem para ele material e a sua organização na obra exterior (...) a língua, em sua determinação lingüística, não ingressa no interior do objeto estético, permanece á sua margem, pois o próprio objeto estético constitui-se a partir de um conteúdo artisticamente formalizado (ou de uma forma artística plena de conteúdo).
Esta imagem possibilita que o seu objeto estético esteja ligado a tudo que possuí acima de uma simples foto, e perceber as informações subjetivas encontradas no seu corpo de significados. E provavelmente a quantidade de informações de que Jinkings oferecia perigo ao povo paraense e isto foi extremamente veiculado pelos meios de comunicação que fez a população de diversos locais do Pará tivesse medo dele, apesar de ter suas atividades realizadas principalmente na cidade de Belém. O que podemos perceber que no trabalho jornalístico, apesar de ter sua principal função à informação, ela acaba algumas vezes ficando impregnada de interesses. E necessário observar que os discursos jornalístico não é neutro e sempre esta ligado a interpretação da sociedade por parte de algumas pessoas.
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA:
BAKHTIN, Mikhail. Estética Criação verbal. São Paulo: Martins fontes, 1992.
_______________. Questões de literatura e de estética – a teoria do romance. São Paulo: Editora UNESp, 1993.
BRAIT, B. & MELO, R. de. Enunciado/ enunciado concreto e enunciação. In: _______ BRAIT, Beth (Org.). Bakhtin: conceitos-chave. São Paulo: contexto, 2005, p. 62-77.
DE LUCA, Tânia Regina. História dos, nos e por meio dos periódicos. In: PINSKY, Carla Bessanezi (org.). Fontes Históricas. São Paulo: Contexto, 2005.
STAM, R. Bakhtin: da teoria literária a cultura de massa. São Paulo: Ática, 1992.
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