segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Experiência estética em expressão semiótica

Irene Machado

1. O que é estética?

            Há bem mais de dois mil anos, filósofos e interessados no estudo da arte e da criação em geral se fazem essa pergunta e ainda estamos longe de chegar a uma resposta. Certo de sua incapacidade de responder afirmativamente a tão controversa indagação, Sócrates arriscou uma resposta negativa: «Estética não é retórica». A dúvida socrática, contudo, não foi suficiente para impedir sistematizações como, por exemplo, o paradigma aristotélico que situa o estético no campo da mimesis. Assim,

No diálogo Hipias maior, Socrates se interroga sobre o que é o belo e chega à conclusão de que definir o princípio estético é uma tarefa enormemente complexa. Aristóteles parece contestá-lo nas primeiras linhas da Poética com a tese de que o que define todo fenômeno estético é a imitação. Desde então muitos acreditam ter resolvido essa questão. Nem Kant nem Bakhtin estão entre eles (Beltrán Almería, 1995: 57).

            Onde e como, então, situar as formulações de Bakhtin sobre a obra estética? A afirmação que distancia Kant e Bakhtin de Aristóteles funda seu argumento na dúvida de ambos com relação à imitação. Nada afirma, contudo, sobre o que, afinal, Kant e Bakhtin definem por estética. Tampouco explicita o laço que une os dois pensadores.
É salutar lembra o que sabemos, por exemplo, que a palavra «estética» deriva do grego aisthesis cujo significado gravita em torno das manifestações da sensibilidade humana que dependem de impulsos internos e externos tais como  sensação, sentido, sentir. “A raiz grega aisth, no verbo aisthanomai quer dizer sentir, não com o coração ou com os sentimentos, mas com os sentidos, redes de percepções físicas” (Barilli, 1989: 2; in Santaella, 1994: 11). Sabemos que as formulações bakhtinianas consideram, sobretudo, as redes de percepções que emergem na experiência pragmática do diálogo, quer dizer, no mundo das interações humanas em curso e, portanto, inacabadas e sensíveis às respostas possíveis. Sabemos, igualmente, que o campo da ação identifica o horizonte da pragmática (termo originado do radical grego pragma designativo de ação) onde Kant situa a ética que orienta o conhecimento sobre o mundo, o que nos leva a inferir que, em Kant, o ato de conhecer se realiza por meio de representações (Neiva, 1979: 39). Na representação, ética, estética e conhecimento constituem o campo da experiêcia. É neste lugar que situamos o encontro de Bakhtin com Kant.
Nossas reflexões ensaiam, portanto, especular sobre a experiência estética no âmbito da pragmática das representações. Não se trata de considerar o fenômeno estético, mas sua configuração semiótica.
            Foi Alexander Gottlieb Baumgarten (1714-1762) quem entendeu estética como disciplina filosófica, ciência do belo ou filosofia da arte. Mas seu principal objetivo era entender a essência do belo, tal como seus antepassados gregos, Platão, Aristóteles, Plotino, que conservaram a tendência antiga de identificar o belo com o bom na unidade do real perfeito, subordinando o valor da beleza a valores extra-estéticos e, em especial, a entidades metafísicas. Somente com Immanuel Kant (1724-1804) o estudo da estética passa a ser realizado à luz da crítica do juízo[1]. Estética é juízo – juízo de valor. Para Kant, pensamento é síntese de duas formas de conhecimento: a sensibilidade e a compreensão. A primeira diz respeito ao mundo das sensações fora da mente e a segunda, ao núcleo conceitual da mente. O conceito (compreensão) se desenvolve na mente, mas pode servir para organizar as sensações fora da mente. A habilidade de pensar é habilidade de fazer julgamentos e requer ambas as formas de conhecimento. O belo, por sua vez, não é reconhecido objetivamente como um "valor absoluto", uma vez que ele se relaciona só com o sujeito. Considerado o ponto de vista do sujeito, é possível chegar aos termos de uma conceituação, ainda que sob forma de hipótese. Se o estético resulta de um juízo produzido por uma vivência, estética pode ser definida como uma forma de dar corpo a experiências vivas. Aqui sim encontramos um manancial para as reflexões sobre a estética como acontecimento na experiência e, portanto, no evento da vivência que não se esgota na vida do indivíduo mas completa-se em diferentes possibilidades da experiência vivente. Este sim é um ambiente amigável ao desenvolvimento das formulações bakhtinianas sobre a estética como resposta dialógica no evento da vida humana.

2. A atividade estética na experiência como construção de sentidos

Diríamos que as formulações de Bakhtin sobre a estética se inserem no campo conceitual de "ciência da percepção", campo em que o conhecimento se manifesta por meio dos sentidos. Entenda-se: sentidos, como rede de percepções físicas ou sistema de idéias; percepção, como refração na óptica numa unidade agregadora de pontos de vista divergentes. Com isso, a estética em Bakhtin não se desvincula da atividade do sujeito, nem do campo perceptivo de convergências divergentes da experiência. Nela se desenrola a luta entre forças centrípetas e centrífugas, sem a qual refrações e extraposições não se manifestam. O campo perceptivo surge como ação de sujeitos posicionados e em relação interativa. A estética é a experiência que acontece no intervalo das relações de um com os outro. Do ponto de vista da percepção humana, trata-se de considerar como um eu é levado a perceber a si próprio na categoria do outro.
A estética de Bakhtin se funda na atividade de construção de sentidos na experiência. Concepção esta que, de fato, se manifesta como postura filosófica que mantém um profundo dialogo com a estética material, em curso no seu tempo, de valorização dos procedimentos estéticos como realização do objeto material da arte (palavra, pintura, musica etc). Procedimentos como forma, como analisamos em estudo anterior (Machado, 1985).  

3. Quando a resposta se apresenta como mutualidade de relações na experiência

Se, do ponto de vista da ciência da percepção, há muito de Kant em tais formulações, do ponto de vista da interação dialógica, há distinções significativas que merecem ponderações. Tal é o caso do conceito de valor. Os valores a que se referem Bakhtin na sua estética geral filosófica não dizem respeito ao belo, ao feio, ao expressivo, ao verdadeiro e todos os demais valores que se consagraram como valores estéticos. Valor é sentido e, como tal, emerge na experiência e nela se constrói continuamente. Logo, estamos longe de considerar valor como dado absoluto. O próprio Bakhtin nos adverte contra o risco de tal formulação: no final de seu livro sobre a estética da criação verbal, cujo ensaio é uma reflexão sobre a metodologia em ciências humanas, afirma: “não há nada morto de maneira absoluta. Todo sentido festejará um dia seu renascimento” (Bakhtin, 1992: 414). Os valores se desenvolvem entre sujeitos no interior da cultura construída pelas interações humanas. Com isso, o objeto estético construído na experiência pode ser dimensionado em interação com as formas fundamentais da vida humana a saber: o conhecimento e o comportamento. Daí que ciência, ética e estética serem dimensões da experiência e, portanto, interligadas por mutualidade de relações.  
            Para Bakhtin, a estética é juízo de valor inserido no conjunto da cultura humana. Foi pensada do ponto de vista do sujeito e o juízo estético como produto da experiência. A estética de Bakhtin é a estética da respondibilidade fundada no diálogo: estética é um ato onde o sentido tem caráter de resposta. A estética da respondibilidade formulada por Bakhtin considera, antes de mais nada, o ato da construção das relações entre seres, ordenando as categorias eu/outro. Dessa noção, podemos esboçar algumas implicações específicas.

1. A estética insere-se na ação humana. Ser humano é significar; significar é articular valores.
2. A estética da respondibilidade fundada no diálogo mergulha na ação viva do fato respondível e responsável, atual e concreto. É o mundo das ações interconectadas num conjunto indissolúvel.
3. Se a estética é uma forma de dar corpo a experiências vivas, "a experiência estética é um tipo especial de experiência fundada num dos momentos que precisam de vida própria e exigem um sujeito contemplativo, isto é, que se situa fora dos limites da vida ativa" (Luis B. Almería, 1994: 59).
4. A experiência estética cria uma visão de acabamento (daí ser corpo da experiência viva), não do interior, mas de um ponto de vista exterior.
5. O corpo estético ocupa um lugar na existência, ainda que o corpo não seja o lugar da existência. O corpo é o centro das ações.
6. O objeto estético surge a partir de um ponto de vista extraposto, fora dos limites da ação específica. Graças à extraposição o acabamento torna-se possível.
7. A extraposição se constrói pela lei geral da percepção: tudo que é percebido só pode ser percebido de um único ponto, dentro de uma estrutura que agrega muitos pontos de visão.
8. O ato perceptivo define-se como uma ação autoral: em que um eu é levado a perceber a si próprio na categoria do outro.
9. A possibilidade de perceber o outro faz da estética uma atividade de resposta.
10. O objeto estético entendido como resposta é material sensível revestido de sentido social, que deve ser entendido pela dinâmica das relações autoria/recepção; pelo conteúdo temático (fragmento da vida) e uma forma artística.

4. Estética semiótica: a semiose da experiência

            Como se vê, estamos muito longe de adentrarmos numa discussão estética situada numa zona difusa do espírito. Cada vez mais, o topos de nossa questões se avizinha da consciência, lugar das tensas relações do homem com o mundo. Relações essas centralizadas por um núcleo que em Bakhtin é muito claro e preciso: as relações de sentido. A "unidade interior de sentido" é condição da criação de uma imagem de totalidade de partes em correlação. Essa é a noção que abre o estudo Arte e responsabilidade (1989: 11-12). Por que a compreensão do que propicia a imagem da totalidade é tão importante? Porque o artista é um homem que está na vida, mas o objeto criado não é a vida, como geralmente defendem muitas teorias.
Bakhtin entende que, "quando o homem se encontra na arte, ele não está na vida e vice-versa". Com isso ele entende que a relação entre arte e vida é uma relação responsiva: "eu devo responder com minha vida por aquilo que vivi e compreendi na arte, para que tudo o que foi vivido e compreendido não permaneça sem ação na vida" (Bakhtin, 1989: 11). O artista não cria a vida, ele cria arte, cria signos, que devem ter, para o outro, significação. Não estamos no campo da mimesis nem da retórica aristotélica que não considerou a relação autor-receptor nem, conseqüentemente, a dimensão subjetiva do gênero como visão de acabamento do objeto estético. Estamos no campo da atividade estética de construção de significação pelos sentidos em que a atividade passa por semiose, tensionando a esfera da vida com a esfera do signo.
A singularidade da atividade estética reside, pois, na sua atividade criadora de signo: embora considere o mundo da experiência e faça dele a realidade pré-existente ao processo criativo, o objeto estético não se confunde com ele. A criação é um ato, mas o ato da atividade estética não se confunde com o ato da atividade cognitiva. Entender a diferença entre ato cognitivo e ato estético foi uma das tarefas de Bakhtin em sua estética geral e filosófica. No estudo "O problema do conteúdo, da forma e do material na atividade estética" (examinado em estudo anterior, ver Machado, 1985), Bakhtin situa o campo das distinções e implicações entre estética e conhecimento onde buscamos orientação para compreender a dialética da representação no signo.
            A relação entre a atividade estética e o mundo da realidade material é dinâmica, responsiva; ao passo que o ato de conhecimento relaciona-se de modo puramente negativo com a realidade pré-existente. Quer dizer, o ato cognitivo cria seu objeto pela primeira vez. A atividade estética é um fenômeno cultural e, enquanto tal, vive num sistematismo concreto: cada fenômeno cultural é concreto e sistemático na medida em que ocupa uma posição substancial qualquer em relação à realidade pré-existente de outras atitudes culturais e por isso mesmo participa da unidade da cultura prescrita. A estética se diferencia do conhecimento e do ato porque acolhe a realidade pré-existente ao conhecimento e ao ato. A atividade estética não cria uma realidade inteiramente nova. Isso fica claro porque na arte nós sabemos tudo, nós lembramos de tudo, ao passo que no conhecimento não sabemos nada. Por isso na arte o elemento de novidade, originalidade, de imprevisto, de liberdade assume papel decisivo. O ato e o conhecimento são primordiais, criam o objeto pela primeira vez. O ato é vivo apenas pelo que ainda não existe: aqui tudo é novo desde o início, portanto, não há novidade, tudo é ex-origine por isso mesmo sem originalidade (Bakhtin, 1988: 33-4).
Logo: Se o homem está na vida ele não está na arte. São muitas as implicações teóricas e práticas que tal conceito nos apresenta.  Vamos nos aproximar de algumas delas.

(a) Objeto estético como resultado de uma visão extraposta.

O conceito-chave, formulado por Bakhtin, para a compreender as relações de pertencimento e distanciamento estético na experiência é aquele fundado na extraposição. Para Bakhtin, somente na arte a vida pode ser representada, isto é, ser uma forma esteticamente significante segundo o valor que anima o contexto das relações sociais. O artista está na vida e não fora dela. Nada é criado fora da vida. Paradoxalmente, sua criação não é vida, é um signo. Para criar o signo, o artista constrói um ponto de vista que se projeta com um certo distanciamento. O artista olha para a vida como se estivesse fora dela. Constrói, assim, um ponto de vista extraposto. O que está fora, repetimos, é o ponto de vista, não o sujeito-criador. Este está no mundo, ocupa seu lugar e dele tem acesso a um campo de visão ao qual ninguém mais tem acesso. A partir  desse ponto, elabora o acabamento que fornece a obra de arte como um todo fechado. A noção de extraposição é fundamental para entender o conceito de posicionamento, de sentido, de dialogia cultural, de texto, de gênero, de enunciação, de signo e, principalmente, a noção de autoria, um dos temas complexos da estética que merece uma focalização isolada.

(b) Acabamento e inacabamento

Inacabamento é o princípio estético a partir do qual é possível considerar a poiesis do dialogismo como campo conceitual da estética bakhtiniana e do modelo artístico do mundo. Não se limita, portanto, ao livro de Dostoiévski, mas pode ser dimensionado nos diferentes campos por onde transitaram suas inquietações.
Em cada uma dessas abordagens, o tema do inacabamento recebe um tratamento diferenciado e, por conseguinte, a tendência estética assume configuração específica. Em seu ensaio “Autor e personagem na atividade estética”, a relação tempo-espaço é abordada a partir do tratamento do personagem como forma espacial, isto é, da incompletude dos pontos de vista que incidem sobre ele. Ainda que estejam integrados ao mesmo e único universo composicional, cada um manifesta um ponto de vista sobre o mundo. O acabamento seria o resultado das projeções dos pontos de vista inacabados ou, dito de outro modo, dos excedentes de visão. O autor pode finalizar o personagem porque ele alcança aquilo que escapa ao campo de visão de sua vivência.
Quer dizer, para criar um personagem, isto é, criar um ser íntegro, concluído a partir de suas próprias finalidades, o autor precisa conhecer aquilo que está fora de seu campo de visão, isto é, sua vivência, seu lugar no mundo – o excedente de visão.
As formulações de Bakhtin foram concebidas dentro do objetivo de compreender a relação entre autor e personagem na obra literária em termos de posicionamento, onde a personagem, tomada pela visão extraposta, foi definida como “forma espacial” (BAKHTIN, 1979, p. 28). O limite do discurso de um e de outro só pode ser apreendido se forem fixados o campo da interação. Por ser elaboração das esferas discursivas da linguagem, o conceito de extraposição colabora para a análise semiótica de outras esferas discursivas da cultura (ver Machado, 2010).
Há que se considerar como princípios do acabamento estético no contexto do inacabamento, procedimentos que se tornaram emblemáticos no campo do dialogistmo. Estou me referindo às formulações sobre o grotesco, o campo do sério-campo e da polifonia.

(c) Imagem da linguagem: a representação do signo ideológico

O objeto estético é, para Bakhtin, um processo de representação por isso a noção de imagem atravessa toda sua formulação. Arte é representação cujo objeto é uma imagem. Não se pode avançar nesse terreno sem antes compreender o conceito de signo dialógico formulado por V.N. Volochinov nos anos vinte, quando Bakhtin trabalhava teoricamente os problemas de estética geral filosófica.
            A representação é, para Volochinov, um processo de significação. Signo é definido assim, como algo que está no lugar de alguma coisa: enten der o signo e, igualmente, o processo de representação como coisa é entender o signo como materialidade. Diz Volochinov: "Um signo não simplesmente existe como parte da realidade ele reflete e refrata uma outra realidade" (Volochinov, 1979:17). Ou seja, o signo tem uma dimensão semiótica. O signo é sempre uma resposta: "entender é uma resposta para um signo com signos", diz Volochinov (1979: 11).
Sem o concurso de grandezas distintas, não existe a mínima possibilidade de se constituir o signo ou, como afirma Volochinov: "Os signos emergem, assim, somente no processo da interação entre a consciência individual e outra. E a própria consciência individual é carregada de signos. A consciência torna-se consciência somente quando ela é preenchida com conteúdo ideológico (semiótico), conseqüentemente, somente no processo da interação social" (1979: 20). Tal processo possui um caráter responsivo, fundamental para o surgimento da obra de arte e para a definição do objeto estético.
            O grande desafio, porém, está no fato de o homem ser signo. Está no corpo do homem um dos signos mais caros a todo processo criativo que é a palavra. A presença da palavra é a força maior na definição do homos semioticus. Por isso, Volochinov define a palavra como "signo neutro", com isso, quer dizer o seguinte: "cada espécie de material semiótico se destina a um determinado campo da criatividade ideológica. Cada campo possui seu próprio material ideológico e formula signos e símbolos específicos para si próprio e inaplicáveis a outros campos. Nesses casos, o signo é criado para atender a uma função ideológica precisa da qual permanece inseparável. A palavra, contrariamente, é neutra em relação a qualquer função ideológica específica" (1979: 22). No signo literário se processa a dialética da representação que o define como objeto estético, ou seja, a dialogia entre arte e vida. O homem é signo, mas o signo literário não é o homem, mas sim a sua linguagem, ou melhor, a imagem de sua linguagem (a obraz iaziká, como podemos ler nos escritos de Bakhtin).

(d) Cronotopia da atividade estética na cultura

            O processo de significação que situamos na natureza do signo literário nos leva à definição da literatura, e o objeto estético que ela pressupõe, em sua função histórica: a compreensão, bem como a significação,  não acontece fora do espaço-tempo da cultura. A significação adquire um caráter cronotópico. Com isso queremos dizer o seguinte: a literatura é fenômeno complexo e multifacético elaborado pelas épocas remotas e vive um grande tempo, que extrapola os limites da contemporaneidade. Aprendemos com M. Bakhtin que a literatura é parte inalienável da cultura humana e não pode ser compreendida fora do contexto de toda a cultura de uma época dada.
            Situar o processo de significação dentro do grande tempo significa para nós definir a função histórica da literatura em sua atividade estetica. No sentido de situar a função histórica da literatura, tal como o formulou M. Bakhtin, é preciso considerar a noção de gênero. Para Bakhtin, o gênero é o elo de vinculação entre as obras, visto que, para ele, os gêneros, literários e discursivos, durante os séculos de sua existência, acumulam formas de visão e compreensão de determinados aspectos do mundo. A função histórica da literatura pode ser compreendida a partir dos gêneros e das visões de mundo ou temas que neles [nos gêneros] estão implicados na evolução cultural.
            Gênero implica formações discursivas na atividade criadora da experiência. Implica construção de sentido, de acabamento no inacabamento; de extraposição; de refração de pontos de vista no campo de visão e nos excedentes que representam o movimento da obra de arte para além – no tempo-espaço onde tudo significa.

Bibliografia selecionada

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[1] Estamos apresentando apenas pontos sumários de uma problemática complexa estudada com muito cuidado pelos autores cujas obras citamos em nossa bibliografia.

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