terça-feira, 21 de setembro de 2010

Em busca da liberdade, do prazer e da verdade acima de tudo

André de Bragança Pereira
     

     Assim passou-se um ano desde o nosso último encontro. Penso como Bakhtin e as nossas reflexões ainda contribuêm para as minhas buscas pessoais. Sim, ele me serve muito como referência para toda e qualquer reflexão. No meu percurso artístico, tenho me deparado com linguagens e formas estéticas cada vez mais sofisticadas. Me considero Arte-Educador e busco incessantemente conhecer o máximo que posso em ambas as áreas. No caminho, tenho procurado aquilo que seja mais justo e verdadeiro. Confesso que não tenho encontrado nada de interessante nas escolas ultimamente. Principalmente nas públicas e sabemos os por quês.
     
     Alternativas, sei que existem, se não houver, inventemo-os. Nesse ano que se passou, optei por inventar. Sei que é muito fácil reinventar a roda, portanto, ativei o meu espírito científico e resolvi pesquisar mais um pouco. Pesquisei, pesquisei, mas algo em mim se dizia estafado e “cheio” dos métodos tradicionais da academia. Cheguei até a ler rapidamente algum comentário em algum artigo escrito por um acadêmico dizendo que é impossível encontrar Arte nas instituições escolares, principalmente a praxis, o “fazer” arte. Concordei num estado de alívio, mas não tive “tempo” para me aprofundar em tais conclusões.
     
      Os tempos atuais de internet são um pouco assustadores para as pesquisas, pois podemos “perder” horas na frente de um computador sem “produzir” de maneira eficiente. Ou será um equívoco julgar que estas horas “perdidas” nos levam a nada. Acredito que as gerações mais novas vão nos ensinar muito sobre isso. Também sei que com 35 anos posso ainda dialogar com os mais “velhos” e os “novos”. Sorte dessa geração que se ainda bem cuidados, tem muita energia pra “dar e vender”. A maneira de ver inúmeras possibilidades de diálogo e de criação se dá pela abertura com que Bakhtin nos ensina para OUVIR E LER O OUTRO.
    
     Para mim a CRIAÇÃO (de qualquer espécie) se dá NESTE INSTANTE. O filtro e as ferramentas dadas generosamente pelas suas obras, são fundamentais para qualquer profissional responsável que deseja fazer e se fazer entender. Ou seja, a obra e sua divulgação são fundamentais para dialogar e assim, enquanto grupo, podemos ainda fazer ciência.
     
     ARTE-CIÊNCIA-POLITICA-ESPIRITUALIDADE são fundamentais ao homem, mas mais que isso, precisamos vivê-los no nosso dia a dia. É o que me interessa aqui. E como fazê-lo? Optei pela expressão artística. Qual?
Ou Quais ?
    
     Quero aqui expressar aqui um pouco do encantamento que sinto com o Teatro e mais especificamente o de Improviso. Existindo desde os anos 20 do século passado, essa linguagem, onde se rompe com o texto, cenas e  expressões prontas, é de grande fascínio popular por onde é passa. É a linguagem democrática por excelencia. Existem muitos formatos, desde curtos até longos, implicando também em inúmeras possibilidades de palco, justamente porque público e atores se mesclam a ponto de não se saber quem toma as rédeas do “jogo”
     
     A figura mais renomada e precursora da linguagem é a americana Viola Spolin, porém ela divide com outros o encargo de divulgar a novidade da época como Jacob Levy Moreno, cujo livro “O teatro da espontaneidade” inspira-nos a repensar a relação ARTE-ESPIRITUALIDADE com maestria. No Brasil quem “amplifica” o movimento são Ingid Koudela e mais tarde, com um tom mais politico, Augusto Boal.
   

     Muitos teatrólogos logicamente discorrem com muita profundidade o assunto, porém aqui cabe refletir um pouco mais sobre o como? e para que? trazer esta ferramenta para a sala de aula e principalmente para as nossas vidas. Aqui eu ilustro apenas a MINHA experiência.

     Por quinze anos, tenho dado aulas de Inglês, Desenho , Música e História da Arte. Um tanto “virtuoso” como muitos brincam. O virtuosismo e a erudição nunca me interessaram, muito menos o universo das explanações rasas de assuntos que encontramos em bibliotecas. Envolvimento, paixão, prática com o mínimo de ciência é o que sempre almejei para mim e para os alunos. Nesse mundo de “extremismos temporais”, como dar conta ? Bakthin veio na hora certa para entender a importância de se saber fazer escolhas justas e verdadeiras, enfim, a própria idéia de “recorte” para se dialogar , interligar e conectar-se com o OUTRO.
    
     Os “recortes” vieram e foram vividas muitas interconexões de linguagens distintas. Chegou o instante de não dar mais chance para a multiplicidade SEM VERGONHA ALGUMA. A idéia de UNIFICAR aqui pode parecer uma HERESIA mas foi um processo FUNDAMENTAL para novos desdobramentos. Foi então que o teatro de improviso veio para UNIFICAR (ou não) tudo que eu tinha desenvolvido até então. É nessa linguagem que encontro hoje infinitas possibilidades para desenvolver as outras linguagens pela CONTAÇÃO DE HISTÓRIAS.
    
     Nas minhas aulas de inglês de hoje, valorizo muito mais a ORALIDADE do que a leitura e escrita. Mesmo porque eu entendo que elas duas são consequência da primeira como o processo básico de escolarização. Coloco uma “pitada” de Paulo Freire com Augusto Boal para tratar dos “oprimidos”. E como faço tudo isso ? Com exercícios de teatro de improviso, desafiando os alunos a criarem histórias que nunca imaginaram criar. E tudo feito de maneira muito simples. Se falta imaginação, trabalhamos o ‘imaginário” com desenhos criados pelos próprios alunos ou imagens prontas que são “esmiuçadas” pelas inúmeras leituras batkhtinianas, para dar mais repertório ao aluno. Outros estímulos sensoriais, como música devem sempre estar presentes.
    
      A partir desses estímulos iniciais, mas que se tornam fins em si também, pode-se “rodar” a máquina da criação teatral sem saber para ONDE iremos. O ESPÍRITO DEMOCRÁTICO e LIVRE deve pairar no ar, pois é nele que o processo criativo se alimenta. No meu entender vejo que quando existe CRIAÇÃO em sala de aula, principalmente se for de maneira coletiva, o conhecimento seja ele de qualquer area do conhecimento, SEMPRE será lembrado pelo aluno e assim a aquisição do conhecimento ACONTECE de fato.
   
     Seria um imenso prazer compartilhar mais as minhas experiências como improvisador. Quem sabe neste nosso encontro não podemos “brincar” e deixar nossas histórias se encontrarem para criarmos novas outras. Tenho certeza de que as surprezas serão boas.

Referências

BAKTHIN, Mikhail - A cultura na Idade Média e no Renascimento: o contexto de François Rabelais. São Paulo: Hucitec; Brasilia: Editora da Universidade de Brasilia, 1987.

BOAL, Augusto – Jogos para atores e não-atores. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2009.

CÍRCULO – Rodas de Conversa Bakhtiniana 2009 – Caderno de Textos e Anotações. São Carlos: Pedro & João Editores. 2009. 420p

MORENO, Jacob Levy – O teatro da espontaneidade. São Paulo: Summus, 1984.

SPOLIN, Viola – Improvisação para o teatro. São Paulo: Perspectiva, 1979.

Internet

    

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